Ínterim

Ínterim, por Felipe Schuery*

Quem se afoga se debate, esmurra a água, faz tudo para se manter respirando. Espera que alguém chegue, deseja uma boia ou alguém que jogue uma corda salvadora. Guga_bruno não. Quem joga a corda é ele, para arrastar quem o ouve para o fundo, para ter companhia em seu naufrágio, em seu mergulho de tanta saudade de alguém.

O desejo desse afogado é afundar. E é preciso dizer que afundar assim, rindo de si, borbulhando ironia, é prazeroso e vale a descida. Homens ao mar! Que lá está frio, é fundo, perigoso, e por isso é justamente onde encontraremos expressão crua e verdadeira.

“Ínterim” é grito de socorro embaralhado com gargalhada de nervoso. São as guitarras rasgadas do rock’n roll “Manual para naufrágio em grandes cidades” e é o coro grandioso de “O pequeno circo místico”. São os solos que choram nos sete minutos de “Estado inerte” mas também a euforia nas súplicas do hit instantâneo “Temperos e flores e rock”, com seu vocal de trêmulos tresloucados.

Não à toa é de guitarra em punho que guga_bruno se expõe nas fotos de divulgação: seu talento no instrumento já havia posto sal na água do Lasciva Lula. Em “Ínterim”, no entanto, guga é muito mais que guitarrista, é todo o mar com todo o sal. Produtor de primeira, multinstrumentista, compositor inspirado, letrista como poucos.

Hora de se mostrar completo lá do alto de sua incompletude, em cada buraco de sua alma perfurada por alguém que partiu, em cada fenda do casco de um navio que afunda enquanto sua orquestra de um homem só continua a tocar.